A frase do título passou-me pelos olhos há muitos anos. Estava incluída num parecer jurídico, onde o advogado "responsável" claramente se preocupava muito mais em proteger-se da responsabilização inerente ao seu parecer, do que com o parecer em si mesmo. Quando a li, ainda estava em início de carreira e à data pouco me parecia impossível. É bom de ver que com a porrada que os anos me foram dando, a frase acabou por se tornar um cautionary tale pessoal, que vai servindo para me orientar nas decisões, sejam elas de foro mais íntimo ou no plano material (compra de casas, carros,...).
A verdade é que sendo eu um gajo cauteloso, que raramente age por impulso (exceto no que respeita a responder a certa e determinada mensagem sobre concertos do outro lado do atlântico), nunca imaginei que o meu país um dia se iria encontrar na situação atual. E se não imaginei, não foi porque não seria capaz de o fazer se me dessem a informação suficiente. Fui completamente ludribiado (que é uma forma bonita de dizer que estes cabrões nos andaram a mentir desde 1986). Nem sequer posso dizer que fui vigarizado, porque o conto do vigário pressupõe que o vigarizado está a achar que vai ficar com a melhor parte do negócio. Não! Eu sempre tive a noção que estes gajos se "orientavam" em grande, até porque 26 anos é muito tempo e alguns deles não disfarçaram lá muito bem. Acreditava é que, não obstante o que tiravam e por muito mal que gerissem a "coisa pública", isto sempre ia dando para levar a tal coisa, que é Portugal, o meu país, para a frente. O mais estranho é que, já nem falando da tal "orientação", aparentemente, sonegar, esconder, distorcer ou pura e simplesmente omitir informação sobre o estado em que Portugal estava não parece ser crime. Ou se calhar é, mas há aquilo dos lugares lá nos conselhos de administração e coiso...
Suponho que se trata da natureza humana. Ir sempre mais além. Ultrapassar os nossos limites. Subir a montanha porque ela lá está. Fazer "desaparacer" milhões de euros, porque eles lá estão. Esta ideia de que nunca é suficiente e mesmo já tendo muito, porque não tirar o restante, sem o mínimo escrúpulo que nos leve a parar e não destruir a vida e os sonhos de 9 milhões de pessoas (dando de barato que 1 milhão, mais coisa, menos coisa, consegue resolver a vida sem grandes dramas) e daqueles que ainda hão-de vir.
Em todo o caso, também não me esqueço dos outros imbecis, que nunca foram poder e talvez por isso não deixaram de prometer, a quem os quis ouvir, a ilusão de uma sociedade igualítária. Essa ideia cretina que todos vamos ter carro (de preferência novo), roupas de marca, um curso superior, casa própria, que todos os trabalhos merecem rendimento igual e que quem tem dinheiro, seja ele poupado, herdado ou fruto do risco, deve ser penalizado por esse crime. A esses atrasados mentais, que não obstante as evidências por esse mundo fora que também a sua proposta de sociedade se corrói e corrompe por dentro, gostaria de lembrar que não podem fazer de conta e apontar para o lado, porque ao desfocar as atenções do que realmente faz a diferença, também eles são responsáveis pelo estado deste país.
Tanto dinheiro, mas tanto dinheiro entrou neste país nos últimos 26 anos. Dinheiro dado, oferecido, caído do céu. Em 26 anos tinha sido possível mudar tudo. Era possível definir um rumo, uma estratégia nacional, nichos de mercado onde Portugal poderia ombrear com os melhores, no turismo, na pesca ou qualquer outra atividade sustentada na geografia e recursos deste país. Era possível propiciar a todos, ou a uma maioria, as ferramentas e o conhecimento para desempenharem o seu papel na sociedade de forma produtiva, com segurança e conforto, contribuindo para o progresso do país e para o seu crescimento pessoal.
Provavelmente fica para a próxima, porque por agora é difícil acreditar que tal será possível.